quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

O Banquete do Medo

Nosso ex-pastor (mas para sempre querido amigo) está nos visitando aqui na terra das Araucárias. Tudo bem que ele chama pinhão de vaso e estação-tubo de “cano-com-homens”, mas até que está se dando bem com o clima temperamental e o povo fechado... ou seria o contrário ?

Temos tido oportunidades de conversar sobre espiritualidade, e, com certeza, esta experiência está sendo muito boa para mim e, principalmente, para a minha Petit – ela está vendo que os seus questionamentos e “bloqueios” são muito mais comuns e populares do que ela imaginava.

A confusão humana, em minha opinião, é devida ao fato que fomos feitos para crescer e multiplicar no Éden, e não na Terra – tal como um animal que foi criado para habitar o topo das montanhas e de repente vê-se obrigado a morar no fundo do mar, temos uma tremenda incapacidade de lidar com situações as mais triviais e mundanas.

Imagine que o organismo foi concebido para respirar uma mistura de 50% de Nitrogênio, 45% de Oxigênio e 5% de gases nobres e, num instante, é jogado em uma atmosfera de 70% de Nitrogênio, 21% de Oxigênio e quase 10% de gases nobres.

É mais que esperado que vá engasgar, tossir, ficar enjoado, tonto, perder o equilíbrio e a noção, ter alucinações, endurecer o coração... mais ou menos aquilo que se vê em qualquer calçada de qualquer cidade de qualquer país de qualquer continente. A incapacidade de lidar com o mundo que o cerca. Muito sofrimento !!!

Porém, acredito que como último ato de amor no Jardim, quando estávamos sendo expulsos do Paraíso, ou mesmo primeiro ato de amor quando íamos marcar pela primeira vez o solo da Terra com os nossos pés, o Senhor nos deu o sentido de sobrevivência.

Sabendo que a partir daquele momento nós passaríamos a sentir frio, fome, aspereza, sede, dor, e calor, o “instinto de sobrevivência” seria fundamental para a nossa... sobrevivência... em um mundo cruel, duro e desconfortável.

Infelizmente, o desejo pela própria sobrevivência é, intrinsecamente, egoísta. O “sai da frente, primeiro eu” está no primeiro parágrafo da primeira página do primeiro capítulo do Manual de Sobrevivência. E o egoísmo, por sua origem individualista, cria o sentimento de posse – “Tira tua mão daí que é meu ! Eu vi primeiro e preciso disto para viver !!!”

Como conseqüência do anseio de propriedade, naturalmente surge o ciúme e a inveja. E estes derivam para a insegurança, seja por uma futura perda ( “Se eu não cuidar vão tomar o meu patrimônio !”), ou por uma eterna posição secundária (não ser o preferido, não ser o “macho alfa”, ser sempre preterido nas promoções).

Da insegurança brota o medo, que se alimenta dele mesmo, e defeca ainda mais dele. Ora, do medo derivam todas as outras mazelas, causas de conflito, e dúvidas do homem, que levam às guerras, selvagerias, insensibilidade, desconfiança, desamor, violência...

Como se não bastasse tudo isto, após o banquete do medo há a ressaca da culpa.

Não, amados, esta não é uma visão fatalista e derrotada. Antes, é uma opinião individual que traz clareza, ainda que não traga explicação. Como disse Sun-Tsu, “se conheceres a ti mesmo e ao teu inimigo não precisarás temer o resultado de mil batalhas” – sempre sairás vencedor. Ainda que não saibas muito bem como vais fazer isto, quando for necessário.

Precisamos ter a certeza de que somos imperfeitos e falhos (e não há nada que possamos fazer para mudar isto). Necessitamos ter a consciência que o sentimento de culpa é filho indesejável das nossas ações ou omissões, sempre que elas não foram condizentes com os padrões das maiorias, ainda que estes mesmos padrões tenham sido desenhados e impostos por uma minoria.

Antes, ainda, precisamos estar convencidos de que “Deus não se entristece pelas nossas imperfeições, apenas pelos nossos pecados”, tal como disse o nosso visitante.

Se acreditamos que o Criador nos conhece desde muito antes de nossa concepção, como poderia Ele ficar frustrado pelas nossas falhas ? Como poderia Ele se decepcionar com alguém que Ele conhece tão bem ?

A culpa é a coleira que os irados colocam nos inseguros. É a “espada de Dâmocles” que a sociedade, os costumes e as instituições alardeiam para controlar aos mansos. É a “consciência moral” divulgada pelo “status quo”. É o dedo em riste que tenta justificar o que não tem explicação. É a tirania da idéia sobre o sentimento.

Tal como em Lucas 23:4, novamente em 23:14, e uma outra vez em 23:22... contando as mesmas três vezes que Pedro posteriormente negou à Jesus, por três vezes Pilatos não encontrou culpa no Cordeiro. Mas a população não deu importância, continuou a apontar o dedo, a incitar a violência, a contestar as ações, a questionar as escolhas, à ser massa de manobra de uma minoria exaltada.

Bem, o restante da história nós todos conhecemos... e aquele único que não tinha mácula foi sacrificado. Mesmo sem ter qualquer culpa.

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